"Eden Lake" por Nuno Reis
Cinema

"Eden Lake" por Nuno Reis


É frequente pessoas normais acharem que os amantes do cinema de terror sofrem algum tipo de perturbação. Quem me conhece e ainda não tinha pensado isso... com "Eden Lake" pensou isso e muito mais. Em menos de um ano assisti quatro vezes ao filme em tela. Em duas décadas que levo a ver filmes penso que foi a minha melhor marca. Talvez o meu primeiro motivo para ir ao filme fosse Kelly Reilly. A incursão da actriz no horror era razão mais do que suficiente para ignorar a restante dezena de filmes que Cannes oferecia à mesma hora. Cheguei, vi e fiquei convencido. Desde então sempre que calhou estar num festival que tinha Eden Lake lá estava eu na sala.
Claro que o efeito surpresa passou depressa. Que o diga quem esteve ao meu lado e teve - a pedido – alertas com cinco segundos de antecedência para todas as cenas fortes.
Deu para reparar em todos os detalhes, desde os comentários da rádio no início do filme, até às relações entre as personagens. A degradação psicológica da Jenny é especialmente notória quando a voltámos a ver a brincar com crianças. Que mudança! Desde professora querida até sobrevivente cobarde e finalmente lutadora, temos um desenrolar de emoções perfeitamente encadeadas. Não fossem os acordes musicais a prenunciar sustos mais fortes que aguardavam vez, o filme seria uma grande surpresa para os incautos.

Esta é a história de um jovem que se quer propor à namorada junto a um lago maravilhoso. O fim-de-semana na Inglaterra rural começa por ser pouco agradável, mas estão felizes e ainda se conseguem divertir com a situação. No lago tudo piora e aquilo que seria um curto par de dias de sonho torna-se num infindável pesadelo. O retiro e sossego por que ansiavam vai-se chamar isolamento. Sem comunicação com o exterior nem transporte, vão ter de correr e lutar pela sobrevivência. O inimigo que os atormenta não é um extraterrestre, animal ou vampiro saído da imaginação de um qualquer argumentista imaginativo. A ameaça é a sociedade, a falta de valores morais que assolam a juventude actual.
O medo sentido pelo espectador não é daqueles que estão limitados ao filme e terminam passados os 90 minutos, este passa para além da tela porque revela os monstros que habitam na nossa rua. É um problema que, não parecendo tão grande como as criaturas do fantástico, é muito mais preocupante porque ataca qualquer um, em qualquer lugar e a qualquer altura. É mais que plausível, é um problema real.

Mais do que ser um filme de que se gosta ou não, é um filme que provoca sempre desconforto. O principal motivo é não haver heróis para apoiar. No lago não se distingue os bons dos maus, são todos selvagens. O comportamento do casal é realista, não reagem de forma muito inteligente, mas é porque estão numa situação indesejável e imprevista, agem apenas por instinto. Se pensarmos nos miúdos dentro do seu contexto familiar, não desculpamos, mas compreendemos o seu comportamento.
Tudo corre como se previa, não como se queria. A sensação de impotência do espectador estende-se até ao último minuto.

Um país é caracterizado pelas pessoas que o ocupam. Este é o retrato de um país sem rumo, sem respeito pelo indivíduo, sem futuro. Basta olhar em volta e percebemos que é para esse cenário que todos os países civilizados se dirigem. Urge uma mudança cultural que vai muito além da escola. Para quando requisitos mínimos para ser pai?



Na ficha optei pelo poster francês que é o mais apelativo entre os poucos existentes. Brilhante como mostra a ameaça animal com um simples sinal de trânsito.

: "Eden Lake" (Reino Unido, 2008)
Realização: James Watkins
Argumento: James Watkins
Intérpretes: Kelly Reilly, Michael Fassbender, Jack O'Connell
Fotografia: Christopher Ross
Música: David Julyan
Género: Terror
Duração: 91 min.
Sítio Oficial: http://www.edenlakemovie.co.uk/



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