?180 Graus? é a estreia na direção de um longa-metragem de Eduardo Vaisman (dos curtas ?Apartamento 601?, ?Dedicatórias? e ?Dadá?). O diretor escalou o trio (extremamente competente) Eduardo Moscovis, Malu Galli e Felipe Abib (não necessariamente neste ordem no grau de melhor atuação, porque os três complementam-se) e convidou a roteirista Claudia Mattos ? decisão mais do que acertada, visto que o filme insere-se no gênero autoral. O roteiro é perspicaz, sutil, despretensioso, sagaz, metafórico e detalhista, funcionando como estrada para que a trama aconteça. Com narrativa não linear, o passado intercala com o presente, sem demonstrar explicitamente ao espectador, que tem a sua inteligência preservada e respeitada. A naturalidade atinge tanto as ações e reações quanto os diálogos, que se expressam por textos longos e viscerais, sendo preciso aos atores a entrega total. Neste momento, quem assiste percebe a qualidade do contexto apresentado. Eduardo conseguiu mesclar em um único lugar (no longa-metragem) naturalidade, dinamismo, manipulação, sem apelações ao clichê e ou óbvio. A atmosfera é como um conto de um livro, meio alienante, mostrando estranheza, porém com convencimento realista e aprofundado. A parte técnica complementa a elegância do não pretender ser algo.
O Jazz inicial apresenta o caminho. A camera anda ao redor dos protagonistas. A fotografia alaranjada, bucólica, comporta-se como atemporal, com nostalgia atual, mesmo datando o momento presente. Os detalhes (por planos e ou por observações dos interpretes) funcionam como fio condutor, conectando e amarrando a história. ?Tem coisa que muda, tem coisa que não muda?, diz-se entre inúmeras metáforas sarcásticas. As frases de efeito ilustram o que quer ser dito. Um gosta de café com açúcar, o outro sem. Como o ditado popular: ?Para bom entendedor, meia palavra basta?. Anna, Russell e Bernardo, os nomes dos personagens, embrenham-se por jogos e cada um compete pelo amor do outro. É um quebra-cabeça que necessita ser montado aos poucos, jogando também com quem está do outro lado da tela. Este embarca na teia de reviravoltas e confusões. Há picardias saudáveis, há crueldade no que se diz, que pode ser seco, direto, defensivo, ameaçador, irritante e desafiador. ?Nasce bonita, mas sem sementes. São gostosas, mas nunca vão dar frutos. O que você espera da laranja? Suco ou semente??, questiona-se.
O ?exilio em São Paulo? de um personagem gera a situação explicita de poder entre empregado e patrão. É inevitável a aparição de clichês: como a música em um pensamento romântico. Mas não prejudica em nada. É um filme de construção. As ações acontecem por causa de ações e ou a fim de explicar ações, que se definem com total liberdade, possibilitando a quem as escolhe o livre arbítrio. ?180 graus é a temperatura total da evaporação do sangue?, diz-se. ?Genial. Isso é verdade??, pergunta-se. ?Claro que não, todo mundo cai em uma cascata bem contada?, responde-se. Há referências ao jornal O Globo, compreensível por contar com a presença de atores globais; e a Livraria da Travessa. A caderneta perdida permeia a trama, gerando O Livro dos Projetos, que acarreta um livro de sucesso. Entendemos que as situações fragmentadas, em elipses, transmitem-se por pequenos contos presentes no livro. A mesma técnica literária usada no livro é a mesma utilizada no filme pelo roteiro ficção. É metalinguagem pura e clássica. O final surpreende. Concluindo, um filme que merece ser visto porque mistura fantásticas interpretações, um roteiro incrível e por não querer ser nada a mais do que uma trama inteligente. Recomendo. Ganhou o FESTIVAL DE GRAMADO de 2010 por Melhor Filme - Júri Popular; e FESTIVAL DE CINEMA BRASILEIRO DE MIAMI 2011 por Melhor Diretor e Melhor Roteiro.
O Diretor
Eduardo Vaisman é formado em cinema e dirige documentários, filmes de curta-metragem, programas de TV e comerciais. Seu curta-metragem Dadá, ganhou mais de 10 prêmios internacionais (Havana, Toronto, Portugal, Rio de janeiro, São Paulo) e participou de mais de 40 grandes festivais (entre eles o Festival de Berlim, mostra Panorama). Começou a trabalhar com cinema em 1989 como assistente de direção em longas-metragens brasileiros e em documentários, muitos de produção estrangeira. 180º, que recebeu o prêmio de baixo orçamento do Ministério da Cultura, é seu primeiro filme de longa-metragem.
- Rápidas E Rasteiras - Vencedores Do Grande Prêmio Do Cinema Brasileiro
O Palhaço é sem dúvida o melhor filme nacional do Último ano, tanto que será nosso representante no Oscar. Essa semana ele ganhou o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro Veja a lista completa dos vencedores do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro:...
- Crítica Revisitada: Sudoeste
A Fábula Monocromática da Existência de Um Dia Por Fabricio Duque Há um bom tempo, devo uma retratação aos participantes e realizadores do filme "Sudoeste", principalmente seu diretor estreante Eduardo Nunes. Parafraseando um dos diálogos finais,...
- 2 Coelhos
Ficha Técnica Direção: Afonso PoyartRoteiro: Afonso PoyartElenco: Alessandra Negrini, Caco Ciocler, Fernando Alves Pinto, Thaide, Marat Descartes, Thogun, Neco Villa LobosFotografia: Carlos André ZalasikMúsica: André AbujamraEdição: Lucas Gonzaga,...
- Eu Não Quero Voltar Sozinho (curta)
Ficha Técnica Direção: Daniel Ribeiro Roteiro: Daniel Ribeiro Elenco: Ghilherme Lobo, Tess Amorim, Fabio Audi Fotografia: Pierre de Kerchove Montagem: Cristian Chinen Música: Tatá Aeroplano e Juliano Polimeno País: Brasil Ano: 2010 Duração: 17...
- Malu De Bicicleta
Ficha Técnica Direção: Flávio Ramos Tambellini Roteiro: Marcelo Rubens Paiva Colaboração:João Avelino e Bruno Mazzeo Elenco: Marcelo Serrado, Fernanda de Freitas, Marjorie Estiano, Otavio Martins, Daniela Galli, Maria Manoella, Marcos Cesana Fotografia:...