Crítica - Skyfall (2012)
Cinema

Crítica - Skyfall (2012)


 
Realizado por Sam Mendes
Com Daniel Craig, Judi Dench, Javier Bardem, Ralph Fiennes

Em 2006, onze anos depois de ?GoldenEye?, Martin Campbell voltou a tomar as rédeas das aventuras do agente secreto mais famoso do planeta Terra. Já sem Pierce Brosnan na pele de 007, ?Casino Royale? afirmou-se como um reboot da saga e da própria personagem, eliminando os gadgets e as narrativas patetas que começavam a atirar Bond para um mundo de parolice pegada, e trazendo uma muito bem-vinda onda de realismo a todo o universo de espionagem à inglesa imaginado por Ian Fleming. Claro que, de início, mil e um rugidos de indignação surgiram de rompante ante a contratação de Daniel Craig para assumir a pele de James Bond. «Um James Bond loiro? Onde é que já se viu?», diziam uns. «Daniel Craig? Bah! Ele não tem o charme necessário para encarnar esta personagem!», protestavam outros. Goste-se ou não de Craig enquanto ator, o que é certo é que o homem aproveitou a oportunidade com unhas e dentes, pegando na personagem pelos tomates e imprimindo-lhe uma aura de durão até então desconhecida do grande público. O resultado de tal abordagem? O seu James Bond inseriu-se como uma luva nos tempos modernos, transformando-se no melhor Bond de sempre, talvez até mais credível e carismático do que o próprio Bond de Sean Connery. Agora já não há pentes que lançam raios, nem canetas explosivas (como, aliás, o Q de Ben Whishaw faz questão de referir neste ?Skyfall?). E isso torna tudo muito mais apelativo para o espectador, que assim passa a encarar 007 com seriedade e não com um sorriso de descrédito no canto da boca. 

   

Dois anos depois de ?Casino Royale?, Marc Forster substituiu Campbell no posto de realização para concluir o fio narrativo que tinha ficado em aberto. ?Quantum of Solace? ficou desde logo uns furos abaixo do seu antecessor, mas conservou o espírito bravio da personagem e trouxe até mais estilo ao modo como esta lidava com as problemáticas apresentadas, encerrando a aventura com um último plano tão misterioso quanto poético. Felizmente, o aclamado realizador Sam Mendes percebeu também a riqueza emocional da personagem e o rumo que a aventura deveria tomar. E com a sua presença atrás das câmaras, este ?Skyfall? tornou-se o filme mais dramático da saga até ao momento, abandonando as intrigas internacionais para colocar todo o enfoque no MI6 e nos agentes que protegem o ?império? britânico. Com Vesper Lynd esquecida de vez, James Bond (Daniel Craig) partiu para outras missões e aprofundou a sua relação com M (Judi Dench). Bond está agora muito longe de ser um novato com sérios problemas de temperamento, sendo antes um dos melhores e mais experientes agentes do MI6. Numa missão de extrema importância, contudo, algo corre terrivelmente mal e o 007 acaba no fundo de um rio com uma bala cravada no ombro. A princípio, todos o tomam por morto em combate. E, sentindo-se traído, ele também não se apressa a apresentar-se ao trabalho. Mas é então que um terrorista informático ameaça destruir o MI6 e assassinar M. E não podendo permitir que tal aconteça, Bond regressa a Londres para se inteirar da situação e partir em busca do terrorista. Uma missão que lhe é imediatamente atribuída, ainda que certos membros do MI6 comecem a questionar as capacidades do agente 007, que já não está propriamente a caminhar para novo? 

 

Não é difícil de chegar à conclusão que ?Skyfall? é o filme mais clássico e introspetivo de Bond desde que Craig assumiu os encargos da personagem. Fiel a si próprio, Sam Mendes interpretou James Bond como um homem vulgar e não como um super-herói isento de falhas (que era o que muitas vezes acontecia nos outros filmes da saga, especialmente antes da era Daniel Craig). Mendes tenta a todo o custo penetrar a carapaça do agente secreto e vasculhar o que lhe percorre a alma, humanizando Bond e fragilizando a sua reputação de máquina demolidora. Isto pode parecer algo de negativo, mas não é. De todo. Pois a personagem ganha toda uma profundidade dramática que nunca antes havíamos visto e o espectador pode dessa forma identificar-se mais com este homem, que possui traumas como qualquer um de nós e que também não escapa aos malefícios do tempo. Não é, por isso, de estranhar que ?Skyfall? seja um filme mais melodramático e menos explosivo. Bond não se entretém tanto a ?engatar? umas miúdas porque tem a alma em estado de provação. Bond não passa o tempo a mandar piadas enquanto desanca nos adversários porque desconfia, nem que seja um bocadinho, das suas presentes capacidades. Ele sabe que está a atravessar um momento decisivo da sua existência. E perante um adversário tão temível como o Silva de Javier Bardem (uma espécie de Némesis ou de sombra negra do 007), Bond empenha-se a fundo na missão e deixa a audiência colada à tela. 

   

Será justo dizer que a entrada em cena de um realizador britânico devolveu o classicismo britânico às aventuras de Bond. As perseguições de carros dão lugar às nuvens cinzentas e à chuva incessante de Londres. As cores aguerridas são substituídas por jogos de sombra e por uma fotografia mais suave. E as piadas lançadas de quando em quando (sobretudo nos diálogos entre Bond e Q) fazem-nos lembrar as tiradas cómicas que imediatamente associamos à Britcom (British Comedy). Por tudo isto, ?Skyfall? é um excelente filme. Mas não é o filme perfeito que talvez esperássemos ver. Na verdade, é superior a ?Quantum of Solace?, mas fica a milhas do equilíbrio de ?Casino Royale?. Silva é um vilão inquietante e Javier Bardem faz questão de nos alertar para isso a toda a hora e minuto. Mas, curiosamente, é precisamente quando o vilão entra em cena que ?Skyfall? começa a perder qualidade. Até certo ponto, a narrativa ainda nos deixa suficientemente empolgados para mantermos os olhos bem abertos e esperarmos com entusiasmo pelo que vem a seguir. Mas a última parte da trama quebra o ritmo por completo e perde muitos pontos no que à credibilidade do enredo diz respeito, deitando quase tudo a perder. Por tudo aquilo que apresenta no início, ?Skyfall? merecia uma conclusão melhor. Uma conclusão mais arrojada e coerente. Porém, acaba por tombar em alguns clichés que nos deixam com um travo na boca. Em suma, pode dizer-se que é um filme satisfatório, com uma palete de cores agradáveis, uma realização segura, interpretações carismáticas e dois ou três momentos de encher o olho. Mas esperava-se muito mais do James Bond de Sam Mendes. 

Classificação ? 3,5 Estrelas em 5



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