Único. Há falta de melhor palavra para o descrever, "The Revenant" é um projeto único, tal como Leonardo DiCaprio já o tinha afirmado. Para além de sobressair pela positiva como uma das produções mais singulares que Hollywood lançou em 2015, "The Revenant" salta também à vista como uma surpreendente obra de sobrevivência e retaliação quase incomparável com o que se tem feito nos últimos tempos em qualquer parte do mundo. Existe portanto muito mérito próprio por parte de
Alejandro González Iñárritu que, após dois projetos altamente consagrados como "Babel" (2006) e "Birdman" (2014), conseguiu voltar a surpreender, inovar e conquistar o espectador. Em alguns pontos, "The Revenant" aproxima-se bastante de "Gravity" (2013), de Alfonso Cuarón. É claro que estes dois projetos pertencem a classes e dimensões completamente distintas, mas existe em ambos uma clara aptidão técnica/ estética que se mistura com uma impressionante história de sobrevivência que testa os limites quase impossíveis do ser humano. No entanto, "The Revenant" transmite-nos uma ideia de maior realismo, crueldade e frieza. É portanto um filme muito mais sério e adulto, onde o drama e a ação andam lado a lado numa jornada de vingança e preservação humana que choca, sensibiliza e cativa o espectador ao longo de mais de duas horas.
A história de "The Revenant", que explora a impressionante história verídica de Michael Glass que, em 2002, Michael Punk deu a conhecer ao mundo no seu homónimo livro, pode-se dividir em dois temas: a retaliação e a sobrevivência. Estes tópicos não são propriamente inovadores ou refrescantes, mas em "The Revenant" são alvo de um impressionante retrato que puxa pela selvajaria humana e por um espirito de crueldade e frieza que, em conjunto, puxam pelo lado mais brusco e animal do espectador. Este é o principal dom narrativo de um produto que se revela tão frio e cruel como os portentosos cenários naturais onde tal jornada de vingança, sobrevivência e guerra tem lugar.
Sem nunca puxar por grandes diálogos ou grandes explicações, "The Revenant" conta-nos uma poderosa história que revela o lado mais puro e selvagem do ser humano. É claro que esta agreste jornada de Michael Glass denota uns certos embelezamentos e excessos cinematográficos já típicos de Hollywood. Tais elementos potencialmente distratores e aparentemente irrelevantes têm aqui uma função muito própria que, como se pode facilmente adivinhar, prende-se com o incremento da violência e do drama no seio de um projeto que tende a ser parado. Embora a presença destes elementos retirem um pouco de confiança e credibilidade à jornada em causa, não se pode negar que cumprem com a competência necessária a sua missão. Não se pode por isso atacar em demasia a sua presença, já que sem estes elementos, a jornada de "The Revenant" poderia apresentar um certo défice de ação e drama que a poderia tornar ainda mais estática e, quem sabe, menos apta para o consumo da maior parte do público.
É interessante, no entanto, salientar que mesmo que a sua trama não tivesse tanto aparato dramático ou violento e seguisse, portanto, um rumo menos chocante, "The Revenant" não deixaria de ser um filme majestoso e espetacular do ponto de vista técnico. À semelhança do que fez em todos os seus projetos anteriores, Alejandro González Iñárritu voltou a exceder-se pela positiva e a criar um produto tecnicamente irrepreensível. A sua estética aposta num impressionante toque de pureza natural que se mescla na perfeição com a sua perceptível temática fria e violenta. No fundo, Iñárritu confere a "The Revenant" uma curiosa mistura entre os estilos de Terrence Malick e Quentin Tarantino, dando assim azo a um filme naturalmente belo e humanamente violento que junta a beleza pura da natureza a uma impressionante dimensão de selvajaria. O resultado final é portanto um produto com cenários naturais puros que servem como uma perfeita tela imaculada para um jogo de força e crueldade que pasma qualquer um.
A beleza do filme em si é notável, sendo belo pela forma, repito, tecnicamente irrepreensível como explora a jornada de Michael Glass, mas também pela forma cuidada como a acolhe e retrata num conjunto de sequências, cenários e planos de elevado primor que denotam uma profunda destreza técnica por parte dos responsáveis por cada um dos seus departamentos técnicos. "The Revenant" destaca-se portanto como um filme robusto e venusto que merece por isso ser devidamente apreciado ao máximo nas Salas IMAX que, sem qualquer dúvida, puxam por todo o arsenal técnico e estético que esta obra tem para oferecer.
É também nas Salas IMAX que o espectador pode aproveitar ao máximo para analisar a soberba performance de Leonardo DiCaprio. Não há quase palavras para descrever o poder e a qualidade da performance de DiCaprio que, para além de dar continuidade a uma série de performances de luxo, supera-se a si próprio com uma prestação multidimensional que merece aplausos universais. Este seu portentoso trabalho ilustra, desde logo, os mais que óbvios sacrificios que teve que fazer para dar vida a uma figura complexa no seio de um produto tão complicado como este. Mas acima de tudo explicita na perfeição a dedicação natural e o talento nato de Leonardo DiCaprio. Esta performance vem portanto confirmar o que todos já sabíamos, ou seja, que DiCaprio é um excelente ator que com "The Revenant" pode acrescentar mais uma dimensão de luxo à sua já vasta classe profissional. Também Tom Hardy tem aqui uma performance de luxo mas a sua performance, embora positiva, está para a de DiCaprio como o seu vilão John Fitzgerald está para o anti herói Michael Glass de DiCaprio, ou seja, numa liga de destreza e ambição completamente à parte.
Tal como a performance de DiCaprio, "The Revenant" é único, mas contrariamente ao trabalho da sua estrela ou do seu realizador, "The Revenant" não é brilhante ou infalível. Há certas falências neste projeto que se prendem sobretudo com o seu enredo, como os já falados excessos. Estes pontos menos positivos, embora perfeitamente aceitáveis, conseguem ainda assim separar esta obra da perfeição máxima. No entanto, "The Revenant" é único e é indiscutivelmente um dos melhores do ano. E isto deverá ser mais que suficiente para o convencer a ver e rever esta obra.
Classificação - 4,5 Estrelas em 5