Crítica: Entre o Amor e a Paixão (Take this Waltz)
Cinema

Crítica: Entre o Amor e a Paixão (Take this Waltz)



A atriz e diretora canadense, Sarah Polley, tem apreço por temáticas dramáticas, sejam elas românticas ou trágicas, buscando sempre um naturalismo poético e indo a contramão dos lugares comuns. Nem sempre acaba acertando, até normal para quem busca estar constantemente envolvida em alguma produção e dentro de sua extensa filmografia como atriz, a moça protagonizou alguns filmes emocionantes, com destaque para Minha Vida sem Mim de 2003. Se interpretando pode-se dizer que tem uma carreira respeitável, o mesmo ainda não pode ser afirmado quanto a seu trabalho de diretora. Sarah Polley tem um longo caminho para se firmar, mas parece estar escolhendo seus projetos com inteligência e trabalhando com muita dedicação.

O seu terceiro trabalho atrás das câmeras, Entre o Amor e a Paixão, exibe resultado bem satisfatório, elaborado com eficiência, tanto narrativa quanta estética e acertando em cheio na temática que pretende tratar. Ainda que tenha seus deslizes (poucos, no meu ponto de vista), como a queda de ritmo no meio do filme, logo depois contornada com a virada da trama, essa bem vinda porção de diretora e roteirista de Sarah Polley traz uma história desenvolvida com propriedade, sensibilidade, esmero e alguma ousadia. Afinal, não é em qualquer filme que se vê uma protagonista famosa em um nu frontal tão desprovido de glamour, assim como a presença, na mesma cena, de um elenco de apoio repleto de senhoras nuas e fazendo piadas (!). Somente por essa seqüência, ainda que ligeira e singela, pode-se perceber o nível de comprometimento dos envolvidos e a pegada desprovida de soluções mágicas. Não é a toa que uma dessas senhorinhas solta uma frase simples, mas pertinente, em meio a uma discussão sobre relacionamentos durante o banho coletivo: ?O novo fica velho.?

A já citada protagonista de Entre o Amor e a Paixão, Margo (Michelle Willians), é uma jovem que trabalha atualizando dados de sites comerciais na internet. Casada faz cinco anos com o escritor de livros de culinária, Lou (Seth Rogen), leva uma vida pacata e sem excessos. Evidentemente existe um sentimento forte entre o casal e a narrativa faz questão de deixar as claras tais impressões, nunca se contrapondo impiedosamente, mesmo quando foca a realidade de desentendimentos do casal. Apesar de Margo e Lou terem uma química evidente, atestada pelas inúmeras brincadeiras intimas que somente um casal que se conhece e convive por um bom tempo pode ter, o relacionamento não é mais o mesmo, talvez até exista amor, mas falta paixão. Como tantos outros casais, eles fazem vista grossa para os inúmeros problemas de relacionamento, mas a ternura, boas lembranças e a esperança pelo ardor de outrora, talvez seja o motivador para apostar em um relacionamento desgastado e infelizmente fadado ao ostracismo.

O elemento desestabilizador-mor da situação entra na trama quando Margo conhece o despretensioso e sedutor Daniel (Luke Kirby). A primeira vez que ambos se avistam é em uma viagem ao Canadá, a qual a moça vai para fazer a cobertura de um parque temático. Logo uma seqüência de coincidências, desde esse encontro inicial no parque, passando pela viagem de volta no avião, onde ocuparam poltronas próximas, e culminando na descoberta de que são vizinhos quase de porta, acabam por serem situações suficientes para criar um elo de atração mutuo. É bem verdade que a ordem súbita de fatos que os aproxima soa excessivamente inverossímil, embora acredite que não seja um fator problemático para desenrolar a história e Sarah Polley lida naturalmente com essas sobreposições que vão sugerindo o acaso do destino. Após conhecer Daniel, essa acomodação inicial de Margo torna-se um incomodo para ela, até porque o rapaz mostra-se interessado em desafiar o comodismo da moça e lutar pelo romance. Essa, então, torna-se a discussão principal de Entre o Amor e a Paixão: preservar o amor seguro? Ou se arriscar em um romance efervescente?

Durante essa digressão, inevitável não surgir comparações com Namorados para Sempre de 2010. Embora a obra aqui em questão lide com problemáticas semelhantes, o filme de Sarah Polleyé menos duro que o do diretor Derek Cianfrance. Em Entre o Amor e a Paixão existe esperança, mesmo apontando para um eterno recomeço e expondo o excesso de conflitos que podem habitar um ser humano. A diretora procura representar essas características e sensações com leveza, suavidade e se por um lado torna a narrativa agradável, por outro, pode incomodar um espectador ávido por verossimilhança. Embora não tenha me sentido incomodado, até porque acredito que cada pessoa tem um modo de lidar com situações difíceis, creio que faltou mais intensidade ao personagem interpretado por Seth Rogen ou talvez sua expressão, muitas vezes apática, seja uma intenção do roteiro. Como não é comum ver o ator em produções dramáticas, com poucos alívios cômicos, surge certa estranheza quanto ao seu Lou, embora passageira.

A atriz Michelle Willians novamente apresenta uma atuação louvável, confirmando-se cada vez mais com uma das interpretes mais confiáveis do cinema americano. A sua Margo é cativante, pode-se até discordar de algumas de suas atitudes, mas nunca odiá-la, de fato, porque afinal, ela só quer amar e ser amada. Suas cenas com Daniel são repletas de bons diálogos, românticas, realistas na medida e também nunca deixando de lado a poesia. Falando em poesia, a edição de imagens que surge a certa altura, montada em sintonia com a canção Take This Waltz, titulo original do filme, é de um capricho estético vistoso, poesia visual de encher os olhos. Verdade que a inspirada canção, do também canadense Leonard Cohen, baseada no poema Pequeño Vals Vienésde Federico Garcia Lorca, por si só, já é um carinho para os ouvidos e ainda aliada às imagens captadas e montadas com talento para o clímax de Entre o Amor e a Paixão, difícil não dizer que formam um par perfeito. Seqüência isolada funcionando fora de seu contexto não é para qualquer filme, apenas para os bons ou muito bons. 







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