Crítica: Tropykaos
Cinema

Crítica: Tropykaos


Por Fabricio Duque

O filosofo francês Jean-Paul Sartre conseguiu resumir a humanidade em uma frase que se tornou viral, ?O Inferno são os outros?. O diretor David Cronenberg também merece crédito com a ?A vida é contemporânea demais? no filme ?Cosmópolis?. Sem esquecer o ditado popular que diz que o único problema do mundo são as pessoas. Essas máximas conduzem a ambientação do caminho do filme ?Tropykaos?, do baiano Daniel Lisboa. O longa-metragem, exibido na 39a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e um dos concorrentes da Semana dos Realizadores 2015, apresenta-se como uma experiência fábula-epifania catártica-alucinógena-lunática-brutal de realismo fantástico ao ?expor" a ?doença? (o ?caos do calor?) da existência atual de nós seres humanos. ?Uma radiação solar ultraviolenta extremada que afeta a cognição humana?, causando mentes ?nubladas". Não precisamos ?ir" longe com nossas próprias análises apocalípticas. Só mesmo quem convive em uma ?sociedade" dita ?democrática" pode perceber as rachaduras hipócritas. A rotina do erro do outro não mais solidário, alheio aos princípios civil-éticos, de ?burlar? regras a própria necessidade (como atrapalhar a entrada no vagão do metrô, por exemplo, e ou a se "estabilizar" em pista dupla nas escadas rolantes - impedindo o direito de ir e vir, e ou a intolerância com as diferenças idiossincráticas político-sociais-religiosas-comportamentais) estimula nos ?sensíveis? (os que estão à margem com seus ideais utópicos anti-sistema), estes que sofrem mais que os outros, inclusive fisicamente, um calor febril psicológico, de dentro para fora, e que quase entram literalmente em ?auto-combustão?. O universo ao nosso redor é hostil. Fato. E altamente egocêntrico. Fato. Vivemos o paradoxo de uma individualidade coletiva, em que cada um possui quereres próprios, massificado por leis padronizadas de conduta. Ser o diferente é estar de encontro ao ?natural" do projetado politicamente correto. Hoje, não se pode pensar ?fora da caixa? que logo o ?bombardeio" crítico já julga, impede a continuidade e extermina novidades. O que ?Tropykaos" oferece ?de bandeja? é uma oportunidade de questionar nossas ações perante esta sociedade ?terminal?. Um grito sufocado. Uma chance terapêutica de nos libertar de nós mesmos por um suspense, quase de ficção científica, interno e sensorial de perigo iminente. Aqui, temos um protagonista com uma intolerância radical ao calor (?Estátuas não têm câncer de pele?), que personifica o ?inferno" de Dante. A solução talvez seja a alienação (e a ?ignorância" - já dizia Oscar Wilde - em frequentar praias lotadas e o ?circo? do carnaval, que faz a cidade ?ferver?). E o não pensamento. Receber a ?comida já mastigada?. Permanecer-se um zumbi. Drogado e bêbado a fim de fugir e de estabilizar a apatia resignada (e assim reverberar mais e mais o desejo dos poderosos - que moldam ?mortos-vivos?). Nosso personagem principal (interpretado arrebatadoramente pelo ator Gabriel Pardal), um vampiro moderno, adentra no conflito à La Carl Marx e seu ?O Capital?, que é precisar ?adequar-se" ao sistema, sendo um ?prostituto" da arte comercial e por total falta de recursos (abrindo ?mão" inclusive do dinheiro fácil e palatável de sua burguesa-rica família), mitigar sua essência criativa. Tudo pela crônica necessidade da artificialidade (um ?ar condicionado?). A utopia ?rasga? frases de efeito de uma poesia marginal à moda ?Branco Sai, Preto Fica?, que mescla Cláudio Assis com Charles Bukowski. O filme é complementado por uma estonteante fotografia de Pedro Urano e por uma edição hipnótica de Eva Randolph. Concluindo, um filme interessantíssimo, altamente crítico e que finaliza com ?Não tenha medo do verão?, de Tom Zé. Não Perca! Recomendado.



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