Cinema
Resenha de Filme: A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty)
Se você me perguntasse, alguns dias atrás, qual era a produção favorita ao prêmio de Melhor Filme do Ano do Oscar 2013, lhe responderia com praticamente certeza de que seria A Hora Mais Escura. Hoje já não posso mais dizer o mesmo, pois a diretora da película, Kathryn Bigelow, não foi indicada ao prêmio de direção e a única vez que o melhor filme não teve seu diretor indicado foi em 1990, quando Conduzindo Miss Daisy foi o grande vencedor.
Acompanhei as premiações dos estados americanos, além de outras importantes pelo mundo afora, e este é, com vantagem, o filme mais premiado do ano. Como pode então um filme com várias indicações e vários prêmios ter a pessoa responsável, por juntar todos os elementos em cenas, excluída da maior premiação do mundo cinematográfico? Meu palpite é bem simples: Política. Posso estar me alongando um pouco na introdução, mas preciso ""gastar" este tempo para defender a merecedora do prêmio, que foi desprezada pela academia.
Para quem não sabe, A Hora Mais Escura, que é uma obra elogiada por todos os críticos, sofreu dura retaliação por parte de alguns senadores de Washington, que enviaram uma carta formal à distribuidora Sony Pictures tratando o filme como impreciso e enganoso. A polêmica gira em torno do fato dos senadores não aceitarem o fato do longa apresentar que os EUA precisou adotar técnicas de tortura para obter informações verídicas, que lhes levassem até a captura de Bin Laden. O fato mais curioso disso tudo é que essa opressão política vem sobre uma situação, que a própria CIA já admitiu ser verdadeira. Os presos de Guantánamo foram sim submetidos as técnicas de tortura. Vejam mais na reportagem do R7 (Aqui).
De fato é possível afirmar que a premiação da academia deste ano tem uma mancha e um caminho aberto para Steven Spielberg brilhar com sua, também excelente, produção: Lincoln. Bigelow sofre assim, injustamente, com a opressão política e deixará de ganhar com uma obra muito mais completa e sensacional do que foi o seu Guerra ao Terror, vencedor em 2010. O trabalho da diretora é simplesmente magnífico e termina por nos brindar com uma aula de história moderna, que passeia sobre o maior atentado terrorista de todos os tempos e todos os atos de terrorismo que se seguiram até a captura de Osama Bin Laden. Tratamos aqui, por exemplo, dos atentados que ocorreram em Londres no ano de 2005, ao Hotel Marriot em 2008 e a própria base da CIA no Afeganistão em 2009. É impressionante o nível de detalhes e cuidados apresentados, que fazem com que esta seja uma obra obrigatória até mesmo nos colégios. Estou sendo repetitivo, não sou fã dela, mas o prêmio justo seria a Kathryn Bigelow.
O roteiro de Mark Boal sofreu críticas pelas inúmeras cenas de tortura, mas é tão excelente, que nem parece que foi reescrito após a captura de Bin Laden, pois para quem não sabe, a primeira intenção de Bigelow e Boal era a de retratar o fracasso americano nas investigações. Os acontecimentos se dão em um tom jornalístico, que mais parece uma grande reportagem sobre os ataques e foram precisos alguns anos de pesquisas e estudos para a melhor roteirização do evento. Fato de seu sucesso vem do sentimento de veracidade que acompanha cada cena disposta. A decisão por afastar qualquer cunho político também foi acertado e evitaram se utilizar muito da imagem do Presidente Americano, que aparece por alguns segundos criticando os atos de tortura.
A montagem, às vezes apressada, e os diálogos rápidos, densos e cheios de informações irão exigir do espectador o máximo de atenção. A perda de uma simples frase pode comprometer o entendimento de toda a película. Um conhecimento, básico, extra filme também seria interessante para o total aproveitamento da trama. Não estou dizendo que é um filme chato e difícil, até porque mesmo não sabendo de muita coisa será aceitável seu desenvolvimento, mas deixo claro que para aproveitar 100% o que lhe está sendo apresentado seria bom um pouco de embasamento sobre o assunto. O cenário desenvolvido é de muita tensão e o clima é de medo por grande parte da produção. Qual será o próximo passo? Como chegaremos a este terrorista? São perguntas feitas pelos personagens, que servem para intrigar ainda mais quem os assiste.
A critério de curiosidade A Hora Mais Escura é um termo militar para o momento certo de realizar um ataque. Kathryn Bigelow, por sua vez, esperou o momento certo e atirou essa produção em meio a uma fase em que está em evidência a luta contra o terrorismo e a captura de seus líderes. Outra forma de consagrar a temática abordada é o sucesso do seriado Homeland, que ganhou todos os prêmios que disputou no ano passado e possui grandes chances de ganhar novamente neste ano com sua segunda temporada. A abordagem de ambos é bastante similar e se parecem mais ainda por possuírem uma protagonista feminina, que abre mão de sua vida particular para viver obsessivamente suas atribuições nas missões.
Jessica Chastain, que ano passado foi indicada por sua atuação em Histórias Cruzadas, é nesse momento uma grande favorita ao prêmio de Melhor Atriz, juntamente com Jennifer Lawrence, de O Lado Bom da Vida. A ruiva é uma atriz diferenciada, que chamou atenção não somente pelas suas escolhas, mas pela sua grandiosa capacidade de atuar nos mais diversos ramos, passeando pelo suspense, romance, western e comédia. Aqui sua personagem é uma agente da CIA, que apesar de questionar os métodos de tortura, acredita que somente com eles obterá sucesso em seus interrogatórios. Seu sofrimento é nítido e muito bem retratado e seu abandono quanto a vida pessoal é muito bem apresentado. Chastain é magnífica e prende a atenção do espectador, que mergulha no turbilhão de emoções que ela transcende da tela. Ela domina cada cena e funciona como uma carregadora de pianos, que rege todo o elenco masculino ao seu redor. Outro ponto perceptível é o nível de auto confiança e de cansaço que sua personagem vai ganhando ao longo dos anos. Um trabalho digno de reconhecimento.
Ainda há uma pequena chama, apesar de bem fraca, de que a justiça poderá ser feita e o prêmio entregue a esta produção. Seria, no mínimo, um pedido de desculpas da academia por ter cedido as pressões políticas. É de longe o melhor filme da carreira de Kathryn Bigelow, sua melhor direção e seu trabalho mais intenso. Não pense também que se trata de mais uma daquelas produções que servem para alavancar o patriotismo americano, pois aqui este nem chega a aparecer de verdade. O foco está naqueles que abriram mão de suas vidas para lutar contra o terrorista, suas conquistas e as consequências de suas decisões. Um filme surpreendente, tenso e sensato. O Melhor do Ano.
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