Resenha de Filme: Somos Tão Jovens
Cinema

Resenha de Filme: Somos Tão Jovens



Em entrevista durante a pré-produção, o diretor Antônio Carlos Fontoura, apoiado pela família de Renato Russo, principalmente a irmã Carmem Teresa Mafredini, deu a seguinte declaração sobre Somos Tão Jovens: ?É um filme para a galera. Os jovens, que ainda se inspiram no Renato, e aqueles que conheciam e já gostavam do trabalho dele. Queria esse diálogo de gerações. Eu costumo dormir no cinema, então queria fazer um filme que as pessoas não dormissem.? Tal afirmação, de viés até meio polêmico, condiz perfeitamente com o clima leve proposto pela obra. Então, seja fã ou não, diminua a ansiedade e procure não esperar algo muito profundo de Somos Tão Jovens. As considerações dramáticas estão lá, presentes nas crescentes dúvidas do protagonista. No entanto, o apanhado passa longe de se ater a uma melancolia predominante. Creio que sem expectativas demasiadas, pode-se divertir um bocado com a volta no tempo que o filme propõe. Uma época de pouca tecnologia, certa ingenuidade, muita amizade e pouco comodismo.

Seguindo passos similares ao do documentário Rock Brasília ? Era de Ouro (2011), o longa-metragem Somos Tão Jovens retrata essa época seminal, embrionária, do nascimento do hoje lendário Rock ?candango?. Apesar de atualmente ser visto como uma fase mítica, a intenção de Antônio Carlos Fontoura, abalizado no roteiro de Marcos Bernstein (Meu Pé de Laranja Lima), de Central do Brasil (1998), é justamente ir à contramão e trazer uma representação despretensiosa, sem tons edificantes e de certa forma abrandar o culto. Afinal, uma vez, o próprio Renato Russo afirmou que não gostava de veneração religiosa, pois não tinha vocação para Padre. A falta do que fazer (como os próprios personagens fazem questão de afirmar), aliada a vivacidade da idade, ainda inspirada na entrada do Punk Rock britânico dos anos setenta, principalmente dos Sex Pistols, motivou jovens de classe média a se expressarem através da música. Mesmo que pouco deles, de fato, soubessem tocar instrumentos com alguma competência. Muitos eram filhos de professores universitários e militares adeptos da ditadura.

Como se sabe, boa parte da geografia de Brasília é dividida pelas Quadras enumeradas. Curiosamente, a que era conhecida por concentrar o maior numero de intelectuais e pensadores da época não levava um número, era apenas chamada de ?Colina?. Com seus violões e cigarros de maconha, o local também era habitado por uma turma que exalava a rebeldia inerente a juventude. Girando em torno dos 17, 18 anos, o mais velho era Renato Manfredini, posteriormente Russo, (no filme, Thiago Mendonça - Tropa de Elite), que na altura de seus 20 anos era idealizado pela rapaziada como um guru. Sua paixão pela transgressão cultural, libertação das convenções, o colocou na rota dos irmãos Lemos ? Fê (Bruno Lemos) e Flávio (Daniel Passi) ? que posteriormente formariam o Capital Inicial. Entretanto, nem Capital Inicial e nem Legião Urbana são o que motivam a narrativa. Ambas as formações musicais têm seu momento no filme, mas a banda a receber mais atenção aqui, percorrendo com suas problemáticas boa parte da trama, é a que leva o ácido nome de Aborto Elétrico. Inicialmente formada por Renato Russo no baixo, Fê Lemos na bateria e o punk sul-africano Petrus (Sérgio Dalcia) no vocal.  

Como propulsora do Rock Brasília, o Aborto Elétrico inspirou outros jovens a fazer música, tendo como sua banda ?rival? a Plebe Rude, do vocalista Phillipe Seabra (Victor Carballar). O próprio faz uma participação especial como um Coronel em certa passagem do filme. Logicamente, Somos Tão Jovens é recheado de canções da época. Algumas com arranjos alterados, mais pesados e condizentes com a crueza musical em voga. E a obra não deixa de assumir sua porção de ?filme musical?, até abraça ela, assim trazendo dinâmica e angariando simpatia. Contudo, a trama, apesar de pontual demais e por vezes episódica, não deixa de esquadrinhar os relacionamentos principais do protagonista Renato Russo: o primeiro deles, com Carminha (Sandra Corveloni), sua protetora mãe, mas com quem não deixava de tratar assuntos polêmicos, como sua sexualidade. O segundo, e considerado por Renato um dos mais importantes, com a amiga de infância Aninha (Laila Zaid). Com a moça, filha de um militar influente, o músico dividia suas frustrações, anseios, felicidades e resignações. A amizade até rendeu uma de suas canções mais famosas.

Ainda que o pouco conhecido ator Thiago Mendonça se destaque na sua concepção de Renato Russo, incorporando gestual, postura e apresentando muita qualidade vocal para entoar as canções, se deve ressaltar o trabalho uníssono do elenco. Aqui, o comprometimento em captar a presunção engajada da época é evidente. Não são atuações repletas de dramaticidade, técnica, mas até mesmo pela juventude dos atores, se nota muita naturalidade na composição dos personagens. De fato, a simplicidade pretensiosa nos convence que tais garotos são as contrapartes púberes de artistas hoje consagrados. Isso faz com que figuras de menor exposição não deixam de ter divertidos momentos. Como o jovem ator Edu Moraes que interpreta um propositalmente caricato Hebert Vianna e praticamente rouba as poucas cenas em que aparece. Aos moldes dos grandes shows musicais, Antônio Carlos Fontoura é ciente da necessidade de deixar sua marca afetiva na memória recente de sua audiência. E Somos Tão Jovens se encerra no auge, deixando uma incômoda, e ao mesmo tempo alegre, sensação de quero mais. 



Ficha Técnica:
Somos Tão Jovens.
Direção: Antônio Carlos Fontoura.
Roteiro: Marcos Bernstein.
Ano: 2013.
Elenco: Thiago Mendonça, Sandra Corveloni, Marcos Breda, Bianca Comparato, Laila Zaid, Bruno Torres, Daniel Passi, Conrado Godoy, Nicolau Villa-Lobos, Sérgio Dalcia, Ibsem Perucci, Victor Carballar, Leonardo Villas Braga, Edu Moraes.   



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