As Cores do Vento
A história? Na verdade é só uma desculpa pra mostrar pra gente tudo que há de mais moderno em efeitos especiais no mercado. Eu até tentei ver em 3D, mas as sessões estavam todas lotadas por 3 dias, então vi em 2D mesmo. No filme, terráqueos (todos americanos, lógico) vão até um planeta chamado Pandora “explorar”. A equipe liderada pela Sigourney Weaver quer estudar o lugar, enquanto a equipe do Coronel Quaritch tem outros interesses pouco pacíficos.
A história é bem intencionada, mas é fraquíssima. Vamos combinar: nenhum chefia americano no oriente médio diz com todas as letras que eles estão interessados no petróleo, como o Giovanni Ribisi disse pra Sigourney que eles só estão ali atrás daquela pedra que custa 20 milhões o quilo. Disfarçam a selvageria de “ensinar a democracia” e de “guerra ao terror”, que é até nome de outro filme do mesmo naipe. Mas eu entendo que esse tipo de filme é endereçado a um público em que pensar não faz parte das suas principais virtudes, então tem que ser tudo escancarado mesmo, senão a mensagem não entra.
O protagonista, o ator australiano Sam Worthington, é um ex-fuzileiro que tem um avatar (que eu bem que tentei, mas não sei como definir exatamente o que é em palavras. Procure um dicionário, por gentileza) para circular pela área, brincar com as águas vivas voadoras, e ele, muito faceiro, acaba “fazendo amizade” com o pessoal local, e sendo ensinado por uma deles, a Zoe Saldaña, a sua cultura. Mas ele de dia é Maria e de noite é João, vive uma vida dupla, um pouco entre os humanos, um pouco entre os Na’vis.
Essa fase de descoberta é linda. Eu já tava esperando a Pocahontas ou a Vanessa Williams (ou a Daniela Mercury) entrar cantando As Cores do Vento. Tudo é tão colorido e fluorescente que não duvidaria nada que o vento tivesse cor também. Engraçado que em Crepúsculo o vampiro-purpurina brilha no sol, já em Avatar tudo brilha no escuro. As plantas, os bichos, tudo! Você é presa de algum predador? Se lascou! Brincar de esconde-esconde? Sem chance! De repente eu olhei pra baixo, e a minha havaiana tava brilhando também. Se eu tivesse colocado o pé para o alto o pessoal ia achar que tava vendo o filme em 3D.
E cá entre nós, essa tecnologia que o James Cameron criou pra transformar atuações reais (os atores, pessoas em carne e osso) naqueles bonecos azuis é revolucionária, inovadora, mas ao utilizar a ferramenta o bom gosto passou longe. Ficou muita informação. Parecia caixa de lápis de 36 cores. E com exceção das plantas (que não passavam de palmeiras, bananeiras, coqueiros, avencas, samambaias e afins), os animais não pareciam de verdade. Pareciam mais personagens de Playstation. Achei as criaturas de Evolução (aquela comédia com a Julianne Moore e o David Duchovny) mais realistas. Mas evidentemente isso daí vai ser aprimorado. Daqui a pouco não precisarão mais de maquiagem pra transformar um ator em alguma biografia. Os efeitos especiais se encarregarão disso. Também não haverá mais gente feia no cinema. Qualquer um vai poder ser lindo e esbelto, de acordo com o padrão de beleza vigente. Toda uma expectativa de inclusão e aceitação da diversidade...
As personagens também não foram nem de longe bem escritos. São todos planos, sem nuances. Principalmente o vilão, que é o estereótipo do estereótipo, desde a total ausência de bondade até as cicatrizes na cabeça. E pra quem lutou numa fictícia guerra na Venezuela (certamente sem nenhum interesse pelo petróleo), me espanta logo no começo o Sam dizer: Na Terra, esses caras [os fuzileiros navais] eram a principal força do Exército. Lutando pela liberdade. Mas aqui eram só mercenários ganhando seu dinheiro. Aí eu pergunto: liberdade de quem, cara pálida?
Eu poderia também escrever um livro sobre aquele planeta em si. Tem muitas coisas duvidosas ali, além do gosto. Por exemplo, se há água em abundância, como pode não haver oxigênio no ar? Por que as montanhas flutuantes não caem? Porque mosquitos voam girando? Ele poderia ter sido muito mais criativo e inovador nesse sentido. Mas aquela árvore luminosa (luxuosa! Vai ser a nova tendência no próximo Natal), superou as minhas expectativas. Eu tava esperando que ela andasse, como em Senhor dos Anéis, ou então fosse igual à vovó Willow de Pocahontas, e desse conselhos.
Os Na’vis são um capítulo a parte. Se o filme fosse meu, eu não faria dos ETs (uns smurfs gigantes) uma mistura de Timbalada com Kaoma. Na hora que a Zoe (que é linda, mas a gente não vê a cara real dela em nenhum segundo) pinta o Sam todo pra uma celebração, eu achei que ele ia começar a cantar Beija-Flor "eu fui embora meu amor chorou...". Ficou tudo muito similar ao que existe na Terra, e se existir vida além daqui, eu suponho que seja algo completamente diferente e totalmente perturbador pra gente. E talvez haja até mais de uma espécie racional, como é aqui. Sério, tem hora que eles lembram índios, pela divisão social, outros momentos as semelhanças com ritos africanos são gigantes, e Pandora, que é uma palavra grega, foi adotada por eles como o nome do planeta. Não dá pra dizer que isso foi bem estudado, né...
E eu como designer tenho que também me repugnar pessoalmente por um instante. Milhões e milhões foram gastos pra se fazer esse filme, mas o sovina do James Cameron não teve a capacidade de contratar um designer pra criar uma fonte exclusiva praquelas legendas quando os nativos falavam! Usaram aquela fonte Papyrus que tem em todo computador. Uma vergonha. Pelo menos, apesar dos pesares, o filme é anti-imperialista, anti-colonialista e anti-armamentista. E não senti sono em momento nenhum durante suas 3 horas. Bom, já falei até demais e eu até poderia continuar, mas acho que já debochei o suficiente. Bato em retirada. Etibandê Preta!