Nem Oito, Nem Oitenta
Enfim, a história é a mesma do filme do Fellini, mas os personagens têm nomes diferentes. E colocaram diversas músicas no meio. Minha opinião? Não vi as produções teatrais, então não posso opinar, mas nessa versão cinematográfica não colou... Eles fizeram o mesmo esquema de Chicago, onde as músicas eram reinterpretações das cenas, onde a gente vê as situações de uma outra perspectiva, como um espetáculo. A gente assiste as duas intercaladas, a versão musical e a dramática.
Mas em Chicago os números musicais são normalmente visões paralelas fruto da imaginação da protagonista (que é obcecada em se transformar em artista de teatro de revista), e aqui não é o caso, e as canções não se encaixaram bem na história. Por exemplo, a Fergie (a cantora do grupo Black Eyed Peas) faz uma prostituta que é uma das lembranças que marcaram a infância do Daniel Day Lewis (o protagonista), enquanto acompanhamos as recordações dele, ela canta “Be Italian”. Apesar da letra combinar, as imagens que vemos não fazem muito sentido...
Bom, deixe-me explicar as personagens e a história. Daniel Day Lewis é Guido Contini, um cineasta que está prestes a começar seu novo filme, chamado Itália, mas ele está travado e não consegue escrever o roteiro. Além de ser atormentado pelas mulheres (reais ou vultos) da sua vida: Marion Cotillard, a esposa; Penélope Cruz, a amante; Nicole Kidman, a atriz favorita e musa inspiradora; Judi Dench, a figurinista e conselheira; Kate Hudson, é uma paquita. Mentira! É uma jornalista americana que é encantada por ele; Fergie, a prostituta que foi importante na sua infância; e a loba romana Sophia Loren (que deve mesmo ter alimentado Rômulo e Remo) faz a mamãezinha querida...
Já deu pra ver que o elenco é uma verdadeira constelação (a Sophia é a cadente...), e esse é um dos problemas do filme. Muita estrela sem ter o que fazer. Lembrou-me de Gosford Park nesse aspecto. Kate Hudson só paga mico e canta uma música de letra ridícula. E que foi escrita especialmente para o filme pra poder concorrer a prêmios. Mas ela tem uma voz boa. Fergie é uma figurante de luxo. E podia ser o melhor papel de todos, se ele fosse melhor aproveitado. Sophia é a pior coisa que poderiam ter colocado no filme. Não tem nada pra fazer, e ainda faz mal o pouco que lhe cabe.
Já as outras 4 têm uma participação interessante. Marion e Penélope têm os melhores papéis. Inclusive a canção da Marion é a melhor coisa do filme. A analogia entre descaso e strip-tease é um dos poucos números musicais em que a música e a cena têm nexo. A Penélope cantando me lembrou a Gretchen... Nicole tá criminosa de tão muitíssimo linda demais. Ela devia ser presa por humilhar o resto da humanidade. Um desaforo. A Judi Dench como conselheira e braço direito do Daniel também tem bons momentos, apesar do papel não exigir nada dela.
Mas o que mais me incomodou é que todas elas são objetificadas, e por um homem que também não mostra conteúdo algum. Aquela coisa machista/moralista. Quando o filme acaba fica aquela sensação de que todas elas (menos a Sophia) podiam ser melhor aproveitadas. Mas mesmo assim é um bom filme e acima da média dos musicais que têm sido produzidos recentemente. E eles voltaram à moda, depois de serem totalmente esquecidos nos anos 80 e 90. Dos recentes, Chicago e Evita continuam imbatíveis pra mim. São no nível de Hair, Cantando na Chuva e Cabaré. Hairspray tem minha afeição e Dreamgirls chegou quase lá.
Rent e Across The Universe nem chegaram aos pés das minhas expectativas. Sweeney Todd, Moulin Rouge e Mamma Mia eu desprezo. Eu lembro de ter lido a sinopse de um musical, que me interessou muito até eu descobrir que tinha a Paris Hilton no elenco. Já é informação o suficiente sobre a qualidade de qualquer coisa. Ela depois ganhou o Framboesa de pior coadjuvante por ele. É até pedrada em cachorro morto dar esse tipo de prêmio a ela. Seria muito mais interessante, por exemplo, a Sophia ganhar, não é mesmo minha gente?