Cinema
Crítica: Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios
Baseado no romance de Marçal Aquino, Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios é o trabalho mais recente do diretor Beto Brant (O Invasor, Cão sem Dono), que aqui assina em parceria com Renato Ciasca. Após a abertura enigmática, aonde vemos uma bela mulher nua posando para alguém a beira de um rio, somos apresentados aos dois personagens principais: Lavinia (Camila Pitanga) e Cauby (Gustavo Machado). Não sabemos quem eles são ou de onde vieram, principalmente a moça, mas deduzimos que o homem é um fotografo, pelas inúmeras fotos espalhadas pelo seu bucólico casebre. Nesse primeiro momento, sem rodeios, Brant mostra que seu filme é um interessante exemplar de cinema e concebido com esmero. Podendo corar um rosto desprevenido, a sua câmera nos faz acompanhar uma deleitosa seqüência de sexo (das mais quentes) entre o casal. Com tamanha intensidade em cena, também constatamos que a atriz Camila Pitanga está despida de qualquer amarra televisiva e entregue ao personagem. Isso ainda sem sabermos do que o filme realmente se trata.
Em um segundo momento, a narrativa nos trás Viktor Laurence (Gero Camilo, bem demais), um jornalista sensacionalista da região aonde esta sendo ambientada a historia naquela exata ocasião. O diretor não deixa muito claro o local, mas sabemos que é uma localização lúgubre, aonde existe exploração de madeira, talvez no Amazonas ou Pará. Da porta de entrada da casa de Cauby, Viktor avista a moça nua e bêbada, e em um comentário ácido, percebemos que aquele relacionamento é escuso, escondido, existe alguém sendo traído. Então, acontece um dos momentos mais vistosos de Eu Reberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios. Beto Brant, após o bem delineado jogo misterioso inicial, nos brinda com um competente flashback, contando a historia da moça, de suas origens e de como ela foi parar ali. Claro que não divagarei sobre esse tempo passado, porque ali estão incluídos os momentos mais reveladores da personalidade da enigmática Lavinia e também os motivos que impulsionam a trama. Vale salientar que a composição do filme é das mais sérias, a realização de Brant não se apega a alívios cômicos, mesmo quando o humor surge (em poucos momentos) é de maneira involuntária e advém do nervosismo dos personagens.
Após passada a empolgação inicial, o filme ganha um ritmo mais contemplativo, menos acelerado e mais poético. As conversas entre Cauby e Viktor são recheadas de citações a poetas, escritores e temas como amor e morte. Nelas, eles usam e abusam de drogas, como Absinto e maconha, que inúmeras vezes (no universo literário) já foram citadas como substancias inspiradoras. A poesia visual pode até ser acusada de marginal, mas não por isso menos bela. Com uma trilha sonora marcante e um uso exímio da câmera, com belos enquadramentos, essa parte do trabalho de Brant é de dar gosto ao espectador. Porém, em certo momento, o próprio diretor parece se empolgar com os tecnicismos e carrega o filme de fade outs, podendo cansar ou diminuir o interesse do público. A narrativa fica entrecortada demais, atrapalhando algumas digressões que poderiam soar mais explicativas. Provavelmente foi uma opção narrativa escolhida com apreço e na intenção de fazer mistério em cima das resoluções, mas não dá para dizer que funcione 100 %. Uma outra ressalva é um tom de denuncia sobre os abusos das corporações que exploram o local, as seqüências em questão não estão bem sintonizadas com o resto do filme e parecem mal arranjadas dentro do corte final.
Os problemas citados não chegam a diminuir ou causar grande impacto no resultado final de Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lindos Lábios. Na verdade, existem muito mais prós do que contras. Uma das principais qualidades, sem duvida, é a atuação de Camila Pitanga. A sua Lavinia, até agora, é um dos melhores personagens de 2012. A representação da atriz é complexa, trazendo a sua personagem uma devida profundidade. Quando Lavinia tem a sua virada na trama, das mais angustiantes, diga-se de passagem, o que presenciamos, continua sendo crível e bem enquadrado no contexto do caráter da moça. Infelizmente, acredito que esse filme do Brant não vai ser tão bem recebido pelo público quanto seus anteriores, mas fico muito feliz por ver o cinema brasileiro voltando a ousar e aspirar um patamar acima da mediocridade que anda imperando em muita das nossas mais recentes produções tupiniquins.
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