Crítica: A História da Eternidade
Cinema

Crítica: A História da Eternidade


Por Fabricio Duque

?A História da Eternidade? é um dos ?daqueles? filmes que conseguem traduzir a poesia artística em instantes filmados, utilizando-se da despretensão de tentar ser algo, mas ?carregando? o personagem no confronto com a ?sociedade? local. E assim se apresenta apenas sendo. Ou melhor, existindo. Dirigido pelo estreante pernambucano Camilo Cavalcante, o longa-metragem, que se inspirou no curta-metragem de título homônimo que o próprio diretor produziu em 2003, busca a fábula metafórica de uma naturalidade realista ficcional. O espectador ?recebe? as sinestesias do ?Tio desviado?, interpretado pelo melhor ator nacional de todos os tempos, Irandhir Santos (Joãozinho ? que se ?expõe? por performances epifânicas de danças viscerais, entregues e câmera giratória à La Ney Matogrosso, consideradas ?macaquices? e altamente preconceituosas ao povo local, e ?ideias? vivenciadas da sensibilidade da arte). ?Eu sou artista e tenho liberdade?, diz. A narrativa segura e detalhista utiliza-se do prólogo musical incidental e sua câmera estática e teatral, sanfona, plano sequencia, enterro de uma criança, ângulo aberto e distante, som superexposto (ora silencioso, ora com música ? quebrando a cadência ? talvez pela trilha sonora nostálgica americana), sofrimento resignado, intercalação do passado e tempo da ação estendido para ambientar a vida simples de uma comunidade interiorana com bodes e forró. No sertão personagens compartilham sobrenome e muitos sentimentos. Amam e desejam ardentemente seus quereres utópicos e platônicos. Na verdade, o filme é sobre ?o destino do amor? e do ?mar?. A trama ?confronta? estes ?seres limitados? com o ?diferente? e que ?envergonham a família?. Outras histórias são intercaladas. Alfonsina (Débora Ingrid) tem 15 anos e sonha conhecer o mar, mas precisa realizar seus afazeres domésticos, como cozinhar para o pai e irmãos. Querência (Marcélia Cartaxo) está na faixa dos 40 e redescobre a vida pelos ?olhos? de um cego e sua insistente serenata diária. Das Dores (Zezita Matos) já no fim da vida, recebe o neto após um passado turbulento, e se entrega à ?sordidez politicamente incorreta? da própria alma. A trama desenvolve-se pelo consumo repetitivo do ?alimento?, por uma incrível fotografia noturna e um estonteante amanhecer no cerrado, entre elipses, capítulos, ?instinto selvagem das feras?, paciências, ?a criação da magia? e de se imaginar o impossível, persistências ?aperriadas?, ?mão aberta no bar? e ?fechada com a filha?, ?juízos de pinto? e dos ?três tipos?: um ?ajuda e esquece?; outro ?ajuda e finge?; e o último ?besta fera ? finge e faz ruindade?; a tempestade ?anunciada? que modifica ? a chuva traz mais verdade e mais redenção que punição; e até mesmo do bêbado caricato e da revista pornográfica. Tudo é construído por momentos e por segredos descobertos ao tempo das coisas para que possamos exacerbar percepções e vivenciar o mesmo ?despertar dos sentimentos adormecidos? de seus protagonistas, que são ?presenteados? com o sol e com a felicidade ?de se deixar viver? do tempo reverso e anti-horário. Foi exibido no Paulínia Film Festival 2014, que entrou no último momento, substituindo o documentário sobre Cássia Eller que não ficou pronto a tempo. E foi o grande vencedor do festival, levando os prêmios de melhor filme, diretor, ator para Irandhir Santos e atriz, que foi dividido por Marcélia Cartaxo, Zezita Matos e Debora Ingrid. Além disso, também levou o prêmio da crítica (Júri Abraccine); sendo também exibido no Festival de Rotterdam e um das exibições mais concorridas na VI Semana dos Realizadores, no Rio de Janeiro. O leitor-espectador-cinéfilo deve atentar ao fato de que o diretor Halder Gomes, de "Cine Holiúdy", fez o treinamento das cenas de luta e que quando a música "Fala", de Secos e Molhados "rasga" a cena, não há como segurar a emoção. 



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