Crítica: Elefante Branco (Elefante Blanco)
Cinema

Crítica: Elefante Branco (Elefante Blanco)



O diretor argentino Pablo Trapero tem apreço por temáticas sociais contundentes, foi assim com Leonera (2008), quando mostrou a vida de uma mulher grávida dentro de um presídio, e Abutres (2010), em que trouxe um sujeito que usava as brechas do sistema de saúde para beneficio próprio. Em seu novo trabalho, Elefante Branco, o diretor volta sua câmera para o cotidiano de uma favela de Buenos Aires que se desenvolveu dentro e em volta de uma gigantesca construção abandonada (daí o titulo), levantada ainda nos anos 50, e que tinha como intenção ser o maior hospital público da America latina. Nesse ambiente insalubre, violento, tomado e divido por facções criminosas, é que temos a nossa trinca de protagonistas, os dois padres de uma congregação local, Julian (Ricardo Dárin) e Nicolas (Jérémie Renier) e a assistente social Luciana (Martina Gusman).

Cada qual o seu modo, os três procuram enfrentar a corrupção da política, que cria inúmeros empecilhos na construção de um conjunto popular nas imediações, as constantes incursões da policia a favela, tão violentos quantos os criminosos locais e o enfrentamento com a cúpula conservadora da Igreja, que vê o trabalho dos sacerdotes apenas como evangelizador, desprovido de atuação social. Apesar dos ofícios poderem ser visto como um tanto edificantes, Pablo Trapero passa longe do maniqueísmo ao retratar as diversas situações limites a que os protagonistas são infringidos. O diretor tem cuidado com seus personagens, dimensionando-os com dúvidas, medos e defeitos pertinentes a quem dispõe a vida para ajudar pessoas que muitas vezes não querem ser ajudadas. Talvez por isso inicie sua obra com uma narrativa distanciada, em tom documental, para depois, aos poucos, ir envolvendo o espectador emocionalmente.

O talentoso ator argentino Ricardo Dárin, no panorama do cinema sul-americano e até mesmo mundial, dispensa qualquer apresentação, mas diferente das atuações catalisadoras de atenção que costuma entregar, em Elefante Branco, o seu trabalho é contido, trazendo um Padre Julian com traços de cansaço físico e mental, principalmente por dar tantos ?murros em ponta de faca?. Seu personagem não chega a ser o grande destaque de Elefante Branco, ainda que impulsione a narrativa, sendo a força motriz e muleta daquela comunidade carente. Com a chegada do Padre Nicolas, todas as atenções se voltam para aquele homem cheio de idéias desafiadoras a um sistema viciado e enraizado. O ator belga Jéremie Renier - de O Garoto da Bicicleta (2011) e Potiche ? Esposa Troféu (2010) ? entrega aqui seu melhor trabalho, imerso em seu personagem, traz uma caracterização eficiente e cheia de propriedade de um sacerdote virtuoso, mas em constante conflito com os dogmas católicos e seus preceitos pessoais.  

Além de toda contextualização bem elaborada, levantando discussões de cunho sócio-político pertinentes a qualquer sociedade com problemas semelhantes (a favela argentina poderia ser qualquer uma do Brasil), Pablo Trapero também demonstra um domínio exímio da câmera. O diretor não se furta a construir vistosos planos-sequência, aumentando a sensação de tensão e caos quando mostra a ação nos becos e vielas da favela. De uma simples visita a um morador enfermo, pode surgir uma seqüência enérgica de tiroteios, daquelas que fazem a adrenalina correrem no sangue. Claro que alguns momentos de Elefante Branco parecem montados no corte final apenas para chocar o espectador com as condições de vida daquelas pessoas, principalmente as cenas que mostram a comunidade depois de uma tempestade ou os redutos de usuários de drogas. Também vejo o filme como uma obra que procura desafiar o público, transcendendo o simples entretenimento e talvez por isso, Elefante Branco tenha um resultado final que pode não agradar em cheio, mas também não tenho dúvidas que seja uma das películas mais relevantes do ano.







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