Crítica: Uma Dose Violenta de Qualquer Coisa
Cinema

Crítica: Uma Dose Violenta de Qualquer Coisa


Por Fabricio Duque

?Uma Dose Violenta de Qualquer Coisa? utiliza-se da premissa existencialista do movimento ?beatnik?, explicitado já no título, que é um trecho de ?Uivo? (poema de Allen Ginsberg*) e que é caracterizado pelo submundo de uma juventude anticonformista. O diretor brasiliense Gustavo Galvão (de ?Nove Crônicas Para Um Coração Aos Berros?) apresenta um ?road movie? que traduz ao ?movimento físico? o ?movimento emocional e intelectual?. Os personagens (erráticos e dúbios) ?fogem? de suas zonas de conforto e tentam encontrar algum sentido em suas vidas tediosas e fadadas a uma mesmice resignada (?Ao fugir da ordem, propôs uma nova ordem?).  Tanto que a frase mais respondida é ?não sei de mais nada?. Substitui-se o ?descanso mental? do cotidiano programado, repetitivo e previsível por ?uma dose violenta de qualquer coisa?. Não se espera nada, mas se aceita sem ressalvas. É nesse caminho que a narrativa conduz seu espectador. Pela naturalidade realista de seus diálogos propositais de amadorismo e por seus atores (Vinícius Ferreira ? o ?necessitado? contido no medo a se transformar; Marat Descartes ? o ?deboche?, o ?escracho? e a loucura procurada; e Leonardo Medeiros ? o ?Jesus paraguaio? salvador do ?Santo Daime?), que se entregam à filosofia de compaixão, amizade, individualismo, personalidade, crueldade e liberdade assistida (deseja-se a solidão, mas não sentida sozinho). Há contraste nos paradigmas apresentados de aliterações, assonâncias, metáforas e ?viagens? lisérgicas e sensoriais no próprio estágio atual vivenciado. As referências fílmicas (?Sem Destino?, ?Um Drink no Inferno?), musicais (?Faroeste Caboclo?) e de diretores (como Quentin Tarantino) estão presentes e ajudam, por incrível que pareça, a equilibrar a ?bagunça? do roteiro não linear e de elipses temporais da construção de ações e reações. Chega a ser um desrespeito aos outros atores ter a interpretação visceral, intensa e magistral de Marat Descartes aqui ou em qualquer outro filme. Não há limites para ele, tampouco clichês. Aqui, busca-se a importância de uma melhoria do ser interior de cada um, a contracultura ?submarina? (de dentro para fora) e o pensamento acima das posses materialistas. ?De repente precisamos decidir se queremos retomar o caminho que idealizamos quando mais novos, ou se cedemos à vida que temos?, ?Isso ocorreu comigo e com todos os meus amigos, quase sem exceção?, disse o diretor. Os protagonistas ?tomaram efetivamente a decisão de mudar? e assim embarcam na própria ?viagem? do autoconhecimento, experimentando limites e angústias, ?diferenças e contradições?, causas e consequências, vivenciando plenamente a catarse como indutor de coragem e mitigador da covardia que é intrínseco ao ser humano. Eles querem a adrenalina do novo, o frio na barriga e o não se saber nada, e são ?arremessados? a própria sorte, prendendo-se ao acaso para a sobrevivência instantânea de se acordar e esquentar alguma parte do corpo que os mantêm vivo. ?Uma Dose Violenta de Qualquer Coisa? não é um filme fácil e que bom que não é. Faz o espectador se questionar, entre jazz ?rasgado? e ?impuro?, o deixa vulnerável na cadeira do cinema, o retira da zona de conforto e o desafia até a última dose. Exibido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo 2013, o longa-metragem está apenas um horário no Espaço Itaú de Cinema no Rio de Janeiro, às 22 horas. Não Perca e aceite o desafio proposto! *"Eu vi os expoentes da minha geração destruídos pela loucura, morrendo de fome, histéricos, nus, arrastando-se pelas ruas do bairro negro de madrugada em busca de uma dose violenta de qualquer coisa"



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