Seção CINEMA // Crítica Julie & Julia
Cinema

Seção CINEMA // Crítica Julie & Julia


Gente Como a Gente

Julie & Julia

Nota: 9,0

É a segunda vez que eu vou pro cinema desde que eu me mudei, e fiquei na dúvida entre o novo do Tarantino e Julie & Julia. Inglorious Bastards não tem recebido boas críticas e eu também já tô saturado de filmes de guerra, então resolvi ver o novo da Meryl e da Amy Adams. É a segunda vez que elas trabalham juntas. O outro filme foi Dúvida, que é excelente, mas nesse novo elas não contracenam juntas. O filme é da Norah Ephron, que é mais conhecida como roteirista. Ela já foi indicada ao Oscar por Silkwood, Harry e Sally e Sintonia de Amor. Gosto muito dos três. Outro “sucesso” dela foi a versão recente de A Feiticeira, com a Nicole Kidman. Esse a gente deixa passar.

Bom, além da Meryl e da Amy, o que me fez ver o filme é o tema principal, que é a gastronomia. A história é sobre Julie Powell, a Amy Adams, uma jovem escritora que não consegue publicar seu livro e trabalha num cubículo de uma companhia de seguros, que ela detesta. Ela é responsável por atender os telefonemas de atendimento ao consumidor, um trabalho que qualquer ser humano deve detestar. É chato tanto para os consumidores que ligam, quanto para o pessoal que atende, e normalmente agüentam todo o mau humor e frustração dos clientes. Enfim... Tentando fugir do seu desespero, ela resolve criar um blog sobre algo que ela adora. Cozinhar. Mas ela precisa de um tema mais específico (cozinhar é muito abrangente), uma meta e de um prazo, senão ela nunca o terminará. Nossa, lembrou quando eu fazia monografia de final de curso.

Ela decide então fazer todas as receitas de seu livro de culinária favorito, da sua cozinheira favorita, a Julia Child, em um ano e escrever todo o processo para o blog. Enquanto isso a gente também acompanha como foi o caminho percorrido pela Julia Child, a Meryl Streep, uma esposa de um diplomata americano em Paris (feito pelo Stanley Tucci, que fez O Diabo Vestre Prada com a Meryl, e os dois têm uma química perfeita), que não sabia com o que se ocupar. Então ela resolveu fazer um curso de chef de cozinha e se tornar uma professora de culinária. A fórmula do filme é bem parecida com As Horas, também com a Meryl, mas o enfoque é completamente diferente, como não podia deixar de ser. Enquanto um é denso e trágico, o outro é leve, divertido, apesar de também ter sua carga dramática. E o roteiro vai compartilhando conosco as similaridades entre ambas as histórias.

As duas histórias são ótimas. Como elas são intercaladas, uma começa a se desenvolver, depois é interrompida e recomeça a outra. Isso me irritava um pouco no início porque a gente fica curioso pra saber como vai ser o desenrolar da história, mas uma é tão interessante quanto a outra. A Meryl no início me pareceu um tanto exagerada, até eu me acostumar com o jeito Julia de ser. Julia Child era uma figura muito peculiar, extravagante. Eu não a conhecia, ela é tipo uma Ofélia americana, mas sua forma de expressar ao falar ou rir são bem pitorescas, e copiá-la fica a um passo do caricato. Pano pra manga pra sátiras, como o Dan Aykroyd fazia no Saturday Night Live. Pena não ter vídeo disso no youtube...

Eu falei um pouco disso no texto sobre Little Ashes. O Robert Pattinson não conseguiu fazer um Dali, mas a Meryl conseguiu fazer uma Julia. Claro que há diferenças entre os dois. Meryl tá aí desde os anos 70, e tem um talento inquestionável. O Robert tá aí há alguns dias, e tem um talento duvidoso... Eu sou cruel, eu sei... A Meryl faz uma Julia alegre e extremamente bem humorada. Talvez até mais interessante do que a verdadeira Julia. Visto a predisposição da Academia a premiar interpretações de personagens reais, é bem capaz da Meryl levar seu terceiro Oscar ano que vem. A Amy faz uma Julie adorável, meiga, e insegura. E entre as duas histórias, a da Amy me conquistou mais.

Assim como as duas, eu também cozinho, com outras finalidades, claro. Julia fez disso sua vida, Julie, uma terapia. Julie cozinhava principalmente por prazer. Apesar de não fazer trabalho burocrático em um cubículo, ou de agüentar mau-humor de clientes, quando eu trabalhava eu normalmente cozinhava a noite quando voltava pra casa. E sempre levava alguma coisa pro trabalho no dia seguinte. Normalmente doces, sobremesas em geral. E enquanto Julie fazia as receitas, vez por outra algo dava errado, como quando ela dormiu e esqueceu carne no forno, ou o frango recheado cai no chão e derrama tudo. Assim acontece comigo às vezes. Ontem eu tentei assar um pão de forma e ele grudou na panela e destruiu meu sanduíche quando eu tentei desgrudar. Isso nunca tinha acontecido comigo. Fiquei com tanto ódio que sacudi a porcaria toda no lixo.

Em outra receita ela tem que matar umas lagostas, situação que a não deixa nem um pouco confortável. Eu também não iria gostar nem um pouco. Ainda bem que a maioria das coisas que eu cozinho já vêm mortas. Que frase horrível... Eu nunca teria coragem de matar um bicho. Quando eu morava com meus pais, minha mãe matava galinhas pra cozinhar. Eu até hoje acredito que ela tem algum prazer sádico em fazer isso, porque ela não demonstra nenhum tipo de culpa. “Se fosse o contrário, ela também faria o mesmo”, ela dizia. Argumento odiado pelos defensores dos animais. Eu sempre saía de perto. Morria de pena deles. Eu também adoro animais, e termino me afeiçoando. Até por galinhas, que eu acabo tratando igual a cachorro ou gato. Lógico que no início eles não reagem igualmente, mas alguns minutos depois, eles respondem ao carinho da mesma forma. Uma galinha acaba dormindo no nosso colo quando a gente faz carinho. É interessante.

Já pararam pra pensar que os animais que a gente mata “com prazer” são os que a gente não come? Tipo rato, barata, mosca, formiga, escorpião, entre outros seres igualmente asquerosos ou repulsivos. Na China eles comem. Fazem até espetinhos dessas “iguarias”. Mas com certeza eles não devem matá-los como nós. Não me pergunte como é porque eu também não faço idéia. Uma barata esmagada é impossível de se colocar num espetinho. Um bicho morto com veneno, não seria muito saudável. Enfim, não sei como eles fazem. Acho que é bom mudar de assunto...

Deu pra notar que houve uma identificação grande com o filme. Citei algumas histórias pessoais parecidas sobre cada trecho do filme, que não fosse exatamente um spoiler. Eu poderia continuar, mas o texto já tá bem longo. Acho que o mais longo sobre um único filme que eu já escrevi aqui. E também não queria entregar mais da história. Acima de tudo, o filme me mostrou que há muitas coisas que ainda eu gostaria de fazer, tipo continuar as aulas de música, tentar outros instrumentos, fazer artes manuais, estudar mais idiomas, ter aulas de geopolítica, que eu adorava e parei desde que saí do segundo grau, entre diversas outras coisas. Acho que eu deveria fazer um curso de culinária algum dia.



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