Crítica: Campo Grande
Cinema

Crítica: Campo Grande


Por Fabricio Duque

?Campo Grande?, que concorre na mostra competitiva de longa-metragem de ficção do Festival do Rio 2015, representa o novo filme da diretora carioca Sandra Kogut (de ?Um Passaporte Húngaro?, ?Mutum?) e integra a lista do Novíssimo Cinema Nacional, que tem como característica principal hiper-dimensionar o realismo. Podemos listar ?Casa de Alice? e ?Ausência", de Chico Teixeira, por exemplo. Aqui, o naturalismo-espontâneo (busca da não-atuação) conduz com sinestesia o espectador à trama abordada, na qual podemos citar o trabalho primoroso da preparadora de elenco, Fátima Toledo, e pela câmera cadenciada-ritmada que se equilibra cirurgicamente do início ao fim. É impossível não lembrar de ?Central do Brasil?, de Walter Salles, e ou ?À Beira do Caminho?, de Breno Silveira, e ou até mesmo (bem longe), ?O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias?, de Cao Hamburger. As referências são observadas sim, mas ?Campo Grande? segue pela unicidade, dotando-se de personalidade, muito pelas interpretações de seus atores ?entregues? totalmente a seus papéis, que tem Carla Ribas, Júlia Bernat, Mary Sheila, e os mirins Ygor Manuel e Raiane do Amaral (excelentes em nível máximo). Já é sabido a dificuldade que se tem de ?treinar" o público infantil. Aqui, assim como em ?Meu Pé de Laranja Lima?, de Marcos Bernstein, Sandra consegue extrair um latente cotidiano quase com estrutura de documentário. Quanto à história, o roteiro ?procura" a fórmula oito ou oitenta. Uma versão maniqueísta do comportamento social. Mesmo ?desmistificando" a Zona Sul (Ipanema para ser mais exato) - e a transformando em dia-a-dia (menos ?glamour?), há um conceito explícito de ?apartheid? geográfico. Fora da ?área rica?, Jacarepaguá e Campo Grande são ?desenhados? como lugares ?depreciativos"-pós-apocalípticos de degradação social, que ?longe" alude à ?Chamada a Cobrar?, de Anna Muylaert. O objetivo é compreendido: uma crítica social às ?zonas de opressão econômica?, ?enaltecida e perpetuada? pela ?burguesia?, que se comporta individualizada e egoísta na forma como vê o mundo. Tudo projetado pela metáfora da mudança. Uma transmutação do ?preconceito" antiquado e massificado durante anos. Sim, tudo é claro. Talvez este seja a principal razão: confrontar ?áreas" e nossos ?medos?. Este é apenas um discurso subjetivo de quem escreve estas linhas. Quanto ao filme, um retrato específico de um momento (que "acaba" sem acabar - será que teremos a continuação de "Campo Grande"?), como um todo, é extremamente competente e bem feito, que ?prende" o espectador por todos os lados, por uma história simples e direta sem ser simplista. A sinopse conta que certa manhã, duas crianças são deixadas em frente à portaria de um prédio em Ipanema, sem nenhuma explicação a não ser um pedaço de papel com o nome e endereço de Regina, a dona da casa. Em nenhum momento as crianças duvidam que sua mãe voltará para buscá-las. Mas será que ela vai mesmo? A chegada dessas crianças no mundo de Regina ? e suas tentativas de lidar com ela ? transformará profundamente as vidas de cada uma delas. Uma obra-prima. Até agora, meu filme favorito. Meu voto certo. Recomendado. Exibido no Festival de Toronto.



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